Eleições e padarias

Vitor Cunha

 

Sobre as eleições autárquicas tenho a dizer que estou feliz por terem passado. Foram dias, em alguns casos até semanas, em que fomos impedidos de circular normalmente nos nossos concelhos pela calamidade sazonal que consiste, de quatro em quatro anos, em magicar uma obra pública capaz de embrutecer mais um bocadinho o já famoso mau gosto nacional. Aqui, na minha zona, foi a substituição de um pavimento perfeitamente adequado por umas listas amareladas que encaminhem o ciclista cego em linha recta, que na ausência destas, decerto se moveria em ziguezague. Como prémio adicional, também conseguimos conquistar a diminuição de lugares de estacionamento e o estreitamento da rua para um passeio onde nunca ninguém andou ou andará a pé. Agora já é possível ao passeio albergar dois obesos que se cruzem a caminho da padaria e montados em elefantes.

 

No dia das eleições ouvi vários políticos a explicarem que o sufrágio era a festa da democracia. Aqui no concelho, e no concelho vizinho, pareceu-me a festa do fabricante de guias de passeio em cimento. Pela quantidade de areia e terra remexida espalhada nos paralelos, também parece a festa do gatinho aflito para urinar.

 

Gosto muito das eleições autárquicas e admito que fiquei muito surpreendido com os resultados, nomeadamente com, graças à campanha, ter ficado a saber o nome do presidente da junta da freguesia onde vivo há vinte anos. Em Lisboa não é assim, pois é a cidade dos famosos. Tal como com Hollywood e um rol de actores que na realidade são empregados de mesa, Lisboa está carregada de pessoas que se dizem políticos, mas que, na realidade, são só vereadores ou, no caso mais extremo, membros de partidos esotéricos como o Livre, Iniciativa Liberal ou Rir (não é uma acrónimo, acreditem em mim).

 

Quanto ao futuro do país, que é o tema deste artigo, tenho a dizer que vai continuar. Ou se abre uma brecha insanável no contínuo espaço-tempo, ou é mesmo garantido que vai haver futuro. Eu tenho fé que vai haver futuro, pois sou um optimista. Como tal, sei que o país vai mudar muito nestes quatro anos, em particular daqui a três anos e onze meses, quando reduzirem ainda mais o passeio para que duas famílias montadas em elefantes se possam cruzar na ida e volta da padaria. Não vai é deixar de ser a mesma merda dos últimos duzentos anos.

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