Daniel Lacalle .
O escândalo da alegada corrupção do fundador do Fórum Económico Mundial (WEF) de Davos seria apenas uma anedota se não fosse mais um exemplo do que ocorreu nos últimos anos com muitas instituições internacionais. O «Financial Times» revela que o fundador do WEF é acusado de manipular os relatórios e estudos da organização para agradar a governos.
Durante anos, muitos de nós assistimos com tristeza a um importante fórum como o de Davos deixar de ser um centro de debate e de confronto de ideias em defesa da livre iniciativa, para se tornar porta-voz de intervencionismos centralizados, do estatismo mais prejudicial e branqueador de governos autoritários, disseminando ideias destrutivas como a do inflacionismo, do socialismo e do «wokeismo» que, na realidade, acabam por ser todas o mesmo.
Davos deixou de ser um fórum de debate para se tornar uma congregação para repetir dogmas intervencionistas e encobrir uma mentalidade única e extrativista; aqueles que defendiam a liberdade económica, os impostos competitivos e o controlo sobre as despesas públicas foram gradualmente marginalizados. Ouvimos aplausos entusiásticos para aqueles que exigem mais impostos e maiores ataques aos criadores de emprego, por contraponto a “debates” unilaterais em que todos os participantes repetiram clichés e palavras como “resiliência” e “sustentabilidade” como cavalos de Troia para o estatismo predatório, onde a ideia de criação de valor e riqueza foi repudiada.
Quem não se lembra da aberração do “não será proprietário de nada e será feliz”, do abandonar a geração de lucros como objetivo, ou da sugestão de que o cultivo do café dever ser proibido porque contribuiria para as alterações climáticas? Com frases como “direitos iguais para os recursos económicos, acesso a serviços básicos, propriedade e controlo sobre a terra e outras formas de propriedade, herança e recursos naturais”, o colectivismo mais absurdo e obsoleto estava a ser propagandeado.
Não aconteceu apenas em Davos. Esta semana, Scott Bessent, o Secretário do Tesouro dos EUA, confrontou o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, expondo a sua cumplicidade na narrativa falaciosa do intervencionismo socialista.
“O FMI e o Banco Mundial têm um valor duradouro, mas a sua missão desviou-se do rumo.”
Foi muito frustrante ver como estas instituições encobriram o aumento constante do peso do Estado na economia, dos impostos confiscatórios e do inflacionismo através de excessos fiscais e monetários. Esqueceram-se do seu papel de garantes do racional económico, de defensores da criação de riqueza, e apoiantes da responsabilidade e prudência fiscais. Em vez disso, tornaram-se cada vez mais permissivos com governos autoritários, exploradores e perdulários.
Bessent declarou:
“O FMI sofreu com o desvio da sua missão. O FMI já foi inabalável na sua missão de promover a cooperação monetária global e a estabilidade financeira. Agora, dedica tempo e recursos desproporcionais a projectos relacionados com as alterações climáticas, o género e outras questões sociais.”
Tal como outras instituições, nomeadamente o Banco Central Europeu, estabeleceu também as alterações climáticas como prioridade, mas abandonou o seu verdadeiro objectivo de estabilidade de preços. Concentram-se em questões cosméticas e ideológicas não relacionadas com a política monetária, estabilidade financeira e responsabilidade orçamental, sendo estas questões de política social dos governos. Além disso, muitas destas alegadas preocupações sociais servem apenas para esconder o branqueamento dos aumentos constantes da despesa pública, de gastos descontrolados, da dívida e dos impostos.
Bessent acrescentou:
“O Fundo Monetário Internacional deveria ser uma poderosa instituição reveladora da verdade. Mas em vez disso, está a «assobiar para o lado».”
Esta declaração de Bessent reflecte a percepção de qualquer defensor da liberdade: muitos relatórios do FMI condescendem com governos que empurram os seus países, empresas e trabalhadores para a ruína financeira.
O leitor recorda-se do apelo do FMI em 2020 para “fazer o que for preciso e guardar os recibos”? Os governos apressaram-se a gastar sem controlo, imprimindo dinheiro de forma imprudente, deixando a pobreza, a inflação, as dívidas galopantes e os impostos sufocantes no seu rasto. Entretanto, em 2024, quando mais de setenta países gastavam descontroladamente devido às eleições e a dívida pública aumentava rapidamente, o FMI declarou uma estratégia de “crescimento seguro, mas lento: resiliência com divergência”. Incrível.
Sobre o Banco Mundial, Bessent declarou:
“O banco não deve esperar mais cheques em branco para um marketing insípido e de chavões, mas pouco empenhado em compromissos para reformas.”
Se as instituições que deveriam garantir a estabilidade financeira, a lógica económica, a responsabilidade orçamental e o crescimento da economia se concentrarem em disfarçar os desequilíbrios fiscais e monetários ou ignorar os ataques à propriedade privada, à estabilidade financeira e monetária ou à livre iniciativa em países com regimes totalitários e governos intervencionistas, então deixam de cumprir as suas funções e tornam-se a orquestra do Titanic.
É tempo de abandonar a propaganda, as desculpas e a cosmética. É tempo de parar de encobrir o intervencionismo e recuperar o papel essencial que estas instituições desempenham na preservação e no reforço do crescimento. É tempo de parar de justificar governos perdulários e de voltar a defender as empresas e os criadores de riqueza.
Não podemos esquecer a importância do FMI, do Banco Mundial, do BCE ou do WEF como garantes da estabilidade económica e financeira e da solidez monetária. O trabalho deles é essencial. Devem por isso voltar a defender o que cria riqueza, reduz a pobreza e melhora a vida dos cidadãos: o crescimento das empresas, o mercado livre, a liberdade económica e a prudência orçamental e monetária. A associação destas entidades internacionais a governos autoritários predatórios levou a uma perda significativa do seu antigo prestígio.
Se durante a última década Davos, o FMI e os economistas tivessem sido tão francos sobre as tarifas e as barreiras comerciais da China e de outras nações, como são hoje sobre a política comercial dos EUA, não precisaríamos de negociações forçadas para nivelar o campo de jogo.
É tempo de estas instituições lembrarem ao mundo que o progresso vem da poupança, da liberdade económica e do investimento prudente, e não das despesas políticas, da dívida e do inflacionismo monetário. As grandes instituições têm muito a contribuir, mas devem saber que enfrentam duas alternativas: recuperar a sua missão de defensoras da responsabilidade orçamental e monetária e da liberdade económica, ou desaparecer.
Artigo publicado pelo Observador em 2025/05/03, integrado na coluna semanal da Oficina da Liberdade.