Confissões de uma idealista

Sílvia Sousa                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           .

Nascida nos finais dos anos 70, a minha infância foi vivida na década de 80.

Filha duma costureira e dum polícia, sempre ouvi da minha Mãe: “a esquerda defende os pobres, a direita pugna pelos ricos”. Ao que o meu Pai sempre respondia: “não ligues ao que a tua Mãe diz”.

Recordo-me da noite em que Mário Soares venceu as eleições presidenciais, de ir para a rua com a minha mãe gritar: “Soares é fixe!”. Lembro-me do meu pai, nunca dado a grandes idolatrias, trazer uma fotografia do Professor Cavaco Silva na carteira. Mas nunca a política foi tema de grande interesse lá por casa, até porque o dissenso era grande.

Quando chegou a minha altura de votar, segui sempre a minha intuição. Fui pelas ideias, mas foram sempre as pessoas que me conquistaram. Nunca me envolvi directamente, nem procurei saber mais. O interesse nunca foi muito.

Em 2017, numa cadeira do curso de Direito, ouvi falar do Sinédrio e dos ilustres que o compunham. Apaixonei-me por aquela parte da nossa História e procurei saber mais.

Estávamos em Março de 2018, quando assisti a uma tertúlia na Casa do Vinho Verde, em que um dos oradores era precisamente o Senhor que fez o favor de me dar a conhecer um pouco da história do século XIX, e não só.

Passei a ser presença assídua nestes encontros e, um dia, ouvi alguém da plateia, com argumentos brilhantes, defender algo com o qual eu nem sequer concordava. Mais tarde, vim a saber tratar-se do Carlos Guimarães Pinto, entretanto eleito Presidente da Iniciativa Liberal.

Fui conhecê-los.

Pelo caminho, fui fazendo amigos, os encontros multiplicaram-se e, em Junho de 2020, aderi formalmente ao partido. Não fui com grandes expectativas. A minha ideia foi sempre divertir-me e crescer intelectual e pessoalmente.

E assim foi. Conheci pessoas maravilhosas e ouvi ideias de vários quadrantes, em total liberdade. Estou-vos muito grata pelas horas que dispensámos a ouvir-nos e a ler-nos, pois, graças a vós, percebi o quão enganada estava. É vosso o mundo. É meu o erro.

O liberalismo que defendo não marcha pelos direitos gay nas avenidas. Porque o meu liberalismo pauta-se pela defesa dos direitos do individuo, independentemente de quem ele escolha para casar, viver ou dar umas cambalhotas. A lei já nos reconhece direitos iguais a todos.

O liberalismo que defendo não abraça causas feministas, porque vivo num país em que a mulher tem direitos e deveres iguais ao homem. Se há lutas a travar, e não as nego, passam pela educação e respeito entre sexos. E quando sempre abordo o respeito, faço-o na perspectiva kantiana de ver no outro o meu eu. Não é legislando que se mudam mentalidades.

O liberalismo que defendo assenta num conjunto de valores e princípios, tendo como objecto principal a vida humana. Não posso nunca estar ao lado de quem legisla contra a sua inviolabilidade.

Esperava mais da Iniciativa Liberal. Procurava irreverência, ideias diferentes, causas nobres e não as “da moda”. Infelizmente, encontrei uma bolha de gente alheada da realidade, a falar para si e entre si. Desconhecem, ou fazem por desconhecer, os verdadeiros problemas do homem médio, das famílias comuns.

Feliz ou infelizmente, a minha vida é passada entre dois mundos e há um que nunca ouviu falar de liberalismo; o outro faz uma pequena ideia, mas não está interessado. Em ambos se vota à esquerda. Há uma mensagem que não passa e, se calhar, ainda bem.

No dia em que alguém quiser conhecer o país socialista e falar para esta gente, para a minha gente, talvez eles vos compreendam e chegueis aos dois dígitos.

Sendo isto um processo a longo prazo, apostai na educação porque os pais já os perdemos, os filhos ainda não.

A curto prazo, mais do que pedir a baixa de impostos, gostava de vos ouvir sobre melhores formas de os canalizar. Acabar com políticas públicas que só conduzem à perpetuação da pobreza, enriquecendo ricos, dando emprego a boys e multiplicando os desvanecidos. Os guetos aumentam, promovendo a exclusão social e a eternização de um sistema que se alimenta de vítimas, tantas vezes culpadas.

Se um dia sairdes da vossa bolha, ides conhecer um país que almeja mudança, que clama por soluções. Mas esse vive no interior, está nos subúrbios das vossas grandes cidades.

Visitem-nos!

(2021, Abril)

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