Os meus dez tostões sobre as autárquicas

Manuel Pinheiro

  1. O PS ganhou, é aritmético, embora essa ideia não tenha ficado no ar porque na noite eleitoral comparam-se expectativas com resultados. Perdeu Câmaras com relevo e Lisboa é simbólica. Porém, teve mais votos do que o PSD a meio da legislatura, supostamente o momento mais fraco, e agora tem 45 mil milhões de euros da bazuca para colocar no País. É certo que precisa de renovar o Governo e ganhar novo ímpeto, mas ainda não perdeu as legislativas de 2023.
  2. O PSD tem um resultado surpreendente, sobretudo, porque a expectativa que todos tínhamos no cinzentão Rio era baixíssima. Lisboa é simbólica e relevante – e não é a única grande vitória. Porém, não vejo que tenha começado hoje a caminhada triunfal para lado algum, salvo se Rio mudar o estilo ou se a economia cair. Ou se Costa se fartar disto e bater com a porta, é claro.
  3. O PCP está numa queda estrutural que as declarações do Secretário-Geral honestamente confirmaram. É muleta do Governo há 6 anos, falhou a captação dos jovens urbanos e só a sua excelente organização trava esta queda. O problema do PCP não são as autarquias, é tudo.
  4. Sem um só comentador nas TVs, ostensivamente ignorado nos directos, o Chega foi a terceira força em muitos Concelhos. Elegeu 19 vereadores e 172 deputados. Talvez tivesse tido mais visibilidade se tivesse optado por concentrar forças em alguns pontos. Nas legislativas, para ganhar deputados, terá de o fazer.
  5. O CDS fez uma jogada inteligente ao coligar-se com o PSD numa boa parte do País e, assim, não se submeteu a votos. Manteve as suas Câmaras, aliás, com maiorias reforçadas. Vamos a ver se foi uma táctica que se esfuma no tempo ou uma inversão de ciclo. Temo que a exuberância do líder na noite eleitoral seja mais o alívio por ter sobrevivido, do que por o CDS estar a inverter a queda. Alguém sabe quais são as ideias do CDS para o País?
  6. Falou-se pouco do Bloco de Esquerda na noite televisiva porque a opinião publicada, muitas vezes sob a capa de jornalismo, é fortemente favorável ao Bloco e antagoniza o Chega. O facto é que aquele elegeu menos vereadores do que o Chega. O Bloco não tem implantação autárquica, anda há seis anos a servir de muleta ao Governo e não tem respostas para os problemas reais, para além do “tudo gratuito”, do eco-feminismo, das causas trans, do combate a Bolsonaro e outros temas que as TVs levam ao colo mas que realmente não despertam o interesse do País.
  7. A IL teve uma noite decepcionante. A colagem a Rui Moreira resultou pouco (o que é que o João Cotrim de Figueiredo foi fazer à sede de Rui Moreira para sair minutos depois?), enquanto em Lisboa teve sorte, pois se os seus votos tivessem roubado a vitória de Carlos Moedas, estava a ser cilindrada. Ainda no Porto, Mayan candidatou-se a uma Junta e fez Moreira perder 20 pontos percentuais nessa Assembleia. A IL está a crescer mas ainda não tem implantação autárquica: esta é a sua eleição mais difícil.
  8. Há muita coisa para aprender com Lisboa. Primeiro, que a arrogância e sobranceria são penalizadas pelo eleitor. Depois, que os Lisboetas têm problemas próprios que não se confundem com os de quem entra e sai de Lisboa todos os dias (alô, Rui Moreira: se os portuenses votassem para a vereação do trânsito, o resultado seria outro). Medina perdeu por demérito próprio e de quem o rodeava como a autarca que ia buscar mercearia gratuita ao mercado. Mas também perdeu por mérito de Carlos Moedas, mérito que é dele e não tanto de Rui Rio. A ver se Moedas é capaz de cumprir nas expectativas geradas.
  9. Os telejornais dão mau nome ao jornalismo. Tecnicamente bem, com os gráficos e as cores, mas com jornalistas e comentadores enviesados. É inaceitável que PCP, CDS, IL e Chega não tenham comentadores. Os painéis de debate são ementa requentada, os do costume com flores uns para os outros porque a seguir vão jantar juntos. Quem queira seguir a noite eleitoral a fundo, tem de acompanhar TVs com internet.
  10. As sondagens: talvez ingenuamente, ainda não entendi se Lisboa é um erro técnico ou uma trafulhice descarada. Seja como for, salvo para o centro de sondagens da Universidade Católica, é uma vergonha.

Em conclusão: muito foguetório. Sim, mudou alguma coisa, mas não muito. Deixem passar duas ou três semanas e logo veremos.

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